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terça-feira, 9 de outubro de 2012

O Fantasma


Os fantasmas existem, estão em nós, estão ao nosso redor, somos nós, estão logo ali em Veneza... Está nos meus olhos que olham dentro de você e percebe a constância de sua presença em você, não mais que em mim. Talvez por isso, esteja eu diferente, achando as coisas tão estranhas ultimamente. Não que nada esteja no lugar errado! Não que nada esteja no lugar certo! Louco me acusavam, mas ele estava lá, ele esta aqui, ele estava ali. Mas, apenas a possibilidade de sua presença amaldiçoa meus passos, minhas palavras, meus pensamentos. Sem esse fantasma, minha vida poderia ser quase completa, seria poeta, continuaria não tendo um vintém, mas estaria em liras à estrela dos meus cândidos amores. Mas, o fantasma nada mais é que minha criação: alimentá-lo ou deixá-lo passar fome? Dependeu de mim! Tornou-se, de julho a outubro, o monstro que ajudou a destruir-me. Criei-o, ao invés de tê-lo matado. Mesmo distante, presente em espírito. Ausente, mais presente que eu. Vi este sinais deste fantasma nas noites de inquietude, nas noites em que teu silencio me atirava a um poço de pensamentos improváveis. Senti-o, pela primeira vez na mensagem subliminar de uma borboleta em um relógio. A borboleta, sinal da teoria do caos.  Relógio sinônimo da passagem das eras, das mudanças. Na conversa tola de outrem, na malicia ingênua e na expectativa do príncipe encantado no cavalo branco... Não, este fantasma nasceu da minha ausência, da falta que ficou na minha ausência. Nem sabia que fantasmas existiam, não soube que era vulnerável a fantasmas. Este fantasma não sabe ser amigo ou inimigo. Mas, me trás medo, me dá arrepios. Torna-me garoto, mais imaturo que o sou. Torna-me a carne pútrida comida pelos abutres. Eu nunca tive medo do escuro, mas sempre pedia a luz acessa. Agora, tenho medo do escuro e mesmo com luzes acesas, durmo por baixo do cobertor. Ouço seus passos no espaço virtual, vejo suas pegadas nas linhas telefônicas, vejo sua sombra nas mensagens que circulam discretamente em sinais de SMS. Ele me faz perceber minha insignificância e, aos poucos, torna-se o verme que primeiro roe as frias carnes do meu cadáver, roubando minha alegria, meus sonhos e expectativas, meu castelo e minha princesa... Como a noite que esconde as sombras das árvores, nada acontece, exceto o meu medo do fantasma. Bem que o mundo poderia ser alienado dos fantasmas. Como o mundo não tirara de mim este medo dorme com minha mãe em camas iguais minh’alma, pra não ser padecer do coração ao lembrar o fantasma. Mas, o fantasma, me tirou algo do qual jamais voltou. Eu o entreguei algo do qual jamais consegui retomar. Então, tendo como justificativa a existência do fantasma, me perco em meu próprio medo! Quantas vezes acordei pensando desafia-lo no dia seguinte? Quantas vezes pensei em esquecer de sua existência e viver um dia de cada vez? Quantas vezes tentei me convencer de que ele não existia? Quantas vezes tentei me convencer de que ele existia? Quantas vezes pensei ouvi-lo virtualmente? Quantas vezes pensei ver suas pegadas virtualmente? Quantas vezes tive certeza de sua existência. Sua presença custa a minha ausência. Ele nasceu na minha ausência, deixei-o crescer na minha presença! Não é justo. Ninguém consegue ouvir-me, entender meus medos, anseios, duvidas e descrenças. Nem tu, estrela dos meus cândidos amores, me ouves e me entendes. Nem tu me dás um vintém de razão. Do contrário, acusam-me de loucura! Louco, vês fantasmas? És psicótico! Chamam-me de imaturo. Criança, vês fantasma? Cresces e não mais o verá! Atiram-me a frente do caminho uivos de lobisomem, vassouras de bruxas, pegadas de bicho papão e orelhas de papa figo... Por cima, ainda me apagam as luzes e causam ruídos estranhos... Tenho medo! Não estou fugindo por que quero, fujo por medo, por reconhecer-me na figura de pequena significância perante meus medos, perante um fantasma distante. Os deuses não me abençoaram com a coragem dos bravos, não me deram o poder de encantar-te, de prender tua atenção mesmo quando ausente. Como última tentativa de resgatar-te do fantasma, cândida estrela dos meus amores, respira, chama-me, para que saibas que estás viva e aprecias minha coragem idônea. Mexes ao menos um dedo, dás ao menos um suspiro, ao menos um. Trocas à atenção de um semideus pelo amor de um mero mortal! A vida na eternidade é enfadonha. Vem viver comigo o vulto da existência, vem? Triste ou alegre serás amada. Chorando ou sorrindo serás amada. Quem te cuida sou eu, quem chora por ti, sou eu, quem sonha por ti sou eu, quem luta por ti sou eu... Não, ela  dorme, dorme... Tem o espirito quebrantado, a  alma cansada, o espirito contristado. Não me escuta, não se escuta. Muitas vozes calam minha voz, muitas vozes a deixa inaudível. Não se acha em mim coragem de aproximar-me para conferir-lhes vida. Ele é o bicho e eu o mortal. Nascido fui da mera mulher mortal: estou aquém na existência humana. O que me cabe senão, contra minha vontade e, a favor da conveniência dos meus medos, diante de minha insignificância, recolher-me a minha mísera condição e assassinar a estrela de meus cândidos amores? Mísero fantasma, que habitas as extremidades da Veneza brasileira: a ti entrego meu corpo para servir-te de riso, de álibi para com os amigos no píer enaltecer-te por ter-me tomado à estrela dos meus cândidos amores. Dedico a ti, como vencedor, minhas lágrimas de tristeza e solidão, o suor do medo que meu rosto exalou na febre a quarenta graus, meu suspiro de cansaço ao correr para longe de ti e, meu sangue aspergido no chão. A ti, que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver, dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas.

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