Sou um homem simples de hábitos simples e repleto de defeitos. Jamais fiz
algo de notório e logo meu nome será esquecido... Porém, em um de tantos
aspectos possíveis da minha vida, posso me considerar um vencedor. Consegui
sentir amor verdadeiro no coração e este amor me fez mudar e lutar até onde me
foi possível pra conseguir reconquistar o amor da mulher da minha vida...
Quem sou eu? E
como acabará esta história?
O Sol já está se levantando, mas a lua ainda está no céu que agora já não
mais está tão escuro quando no momento em que iniciei esta escrita, agora está
acinzentado. Estou no meu quarto, em minha cama fria e vazia que um dia já
esteve quente por conta dos nossos corpos se amando. Vez por outra levanto-me e
observo minha imagem no espelho. Não estou uma figura digna de ser vista, esta
madrugada: olhos fundos e marejados, um pouco mais magro e pálido e um rosto abatido.
Trinta e poucos anos, penso às vezes, e apesar da minha própria aceitação
desta minha idade, ainda me surpreende que sinta ao corpo estas sensações ao
lembrar-me de quem amo. E pergunto-me se será assim com toda a gente da minha
idade, ou sou um caso único.
A minha vida? Não é fácil de explicar. Não tem sido o percurso
naturalmente ou um percurso esplêndido ou até mesmo um caminho dos derrotados. Sou
de descendência afro indígena, com um sinal do lado esquerdo do rosto que a
vida me deixou, magro, 1,83 cm de altura. Calculo que não seja dos homens mais vistosos,
fortes ou cultos que uma mulher possa se sentir esplendidamente apaixonada à
primeira vista.
Uma carreira acadêmica regular, uma iniciação profissional regular, um
pouquinho de reconhecimento pelo meu trabalho... E aprendi que nem toda a gente
pode dizer o mesmo da sua vida e que eu mesmo não posso reclamar dos rumos que
a minha tomou.
Mas não se iludam. Não sou nada de especial e disto estou certo.
Sou um homem vulgar, com pensamentos vulgares, e vivi uma vida vulgar. Depois
de algumas perdas - quase insuperáveis -
e ganhos de aprendizagem aprendi a repensar minha vida e mudar meu proceder.
Os românticos chamariam este relato de história de amor, os cínicos certamente
a classificariam como uma tragédia, ao passo que para a moçada lá do botequim é
careta se alguém fala de amor.
Para mim tem um pouco de ambas as partes, e
qualquer que seja o modo como se escolha olhá-la, não se altera o fato de que
se trata de uma parte muito importante e inesquecível da minha vida e do
caminho que por opção pessoal escolhi percorrer, mas que me levou a fins não desejados.
Não tenho queixas a fazer quanto ao meu percurso, nem quanto aos lugares
aonde me levou, nem da mulher que amei e que me trouxe até este momento. Talvez
que sobre outras coisas pudessem ser rearranjadas de outra maneira.
O tempo, infelizmente, não torna fácil o manter do curso, não me
proporciona esperar muito, minha saúde frágil não suporta tanto tempo além de
uma ansiedade crônica que me mancha, me marca o rosto e vez por outra me causa taquicardia.
O caminho continua como
sempre, juncado com as pedras e o cascalho que se vão acumulando ao longo de minha
vida, o que muda é que por hora sigo a sós comigo mesmo a estrada de tijolos
amarelos.
Até bem pouco tempo atrás, questão de um mês, teria sido fácil de ignorar
todas estas adversidades, mas agora é impossível. Uma doença misteriosa rola
através do meu corpo, minha mãe diz ser psicológico, produto da tristeza. Mas,
o fato é que já não sou forte nem saudável como antes. Não sou tão galanteador
quanto nos tempos áureos, nem tenho o coração insemeável quanto antes. Os meus
dias vão-se gastando como um velho balão de festa: inerte, esponjoso, e a
tornar-se cada vez mais mole e ao mesmo tempo indiferente com o tempo. Uma
febre me visita algumas noites, meu pulmão reclama e minha cabeça acusa todos
os dias que não está ignorando os fatos.
Tenho consciência de que as probabilidades estão contra mim. Mesmo que eu tenha ou esteja indo em direção contrária ao sentido do amor. Mas o amor nunca tem uma
resposta definitiva. Nós é que escolhemos dar ou não essa resposta. Isto eu sei, aprendi-o durante a minha vida. E tal entendimento deixa-me com a crença de que o amor, por mais inexplicável ou explicável, em mim foi real e pode ocorrer sem que eu possa estar atropelando a ordem natural das coisas.
Assim, uma vez mais, tal como agora o faço, começo a escrever este
relato, na esperança de registrar o amor que veio a dominar a minha vida, já na fase
tardia, possa prevalecer em um canto especial do meu coração como crença para os momentos de minha
vida que se seguirão.
E por hipótese, só por hipótese, e talvez aconteça, terei
renascido e não terei voltado ao estado psicológico de onde um dia adoeci...
Assim começa o capítulo que relata minha vida amorosa...